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A Poesia do Drible

"Um pouco mais de sol - eu era brasa, Um pouco mais de azul - eu era além. Para atingir, faltou-me um golpe d'asa... Se ao menos eu permanecesse aquém..." - excerto de "Quasi", de Mário de Sá Carneiro

"Um pouco mais de sol - eu era brasa, Um pouco mais de azul - eu era além. Para atingir, faltou-me um golpe d'asa... Se ao menos eu permanecesse aquém..." - excerto de "Quasi", de Mário de Sá Carneiro

A Poesia do Drible

10
Nov23

Tudo ao molho e fé em Deus

O tolerável peso de Talião e a insustentável leveza do lítio


Pedro Azevedo

O Sporting recebeu o Rakow, clube proveniente de Czestochowa. Antes que o Leitor avance que o presumível domicílio do nosso adversário de ontem é a parede do consultório de um oftalmologista onde se projectam aleatoriamente umas letras dispersas, quero informar que Czestochowa é um centro importante de reciclagem de lítio, pelo que seria de supor que os polacos chegariam a Alvalade de baterias carregadas. Não contariam porém que aos 9 minutos funcionasse a Lei de Talião, recebendo o Sporting em troca a compensação da "lesão" ocorrida no jogo de ida: se o Gyokeres havia sido expulso no dealbar do jogo na Polónia, um polaco (Racovitan) deixou a sua equipa a jogar com menos um numa fase prematura do prélio de Lisboa. Como a Lei de Talião está descrita no Antigo Testamento e o Racovitan soa a medicamento do tipo "vais ver o que é bom para a tosse", é caso para dizer que foi remédio santo: o VAR deu o veredicto e o árbitro evitou o "de lítio de opinião" e ratificou a decisão. Como alcavala veio um penalty que o Pote transformou em golo: 1-0 para o Sporting. (Na origem de tudo isto esteve o St Juste, que recuperou a bola e depois sprintou 60 metros à Bolt até ser agarrado perto da meta pelo Racovitan.) 

 

Em superioridade numérica em campo e no marcador, seria de esperar que o Sporting carregasse no acelerador. Mas não, Alvalade começou a lembrar um relvado com vista para a Luz, com os jogadores do Sporting a encanarem a perna à rã (que se sabe ser verde). E assim o jogo arrastou-se até ao intervalo, apenas com uns safanões do Edwards e do Bragança a acordarem-nos momentaneamente da letargia. 

 

O segundo tempo começou com um golo do Paulinho. O estádio vibrou em dia de aniversário do nosso avançado centro. Só que o golo foi anulado, voltando tudo à primeira forma. Pouco depois, o Edwards pegou na bola e tirou um daqueles centros tão venenosos que queimou logo o braço de um polaco. A arbitragem, albanesa, voltou a ser Tirana, mas o VAR viu e recomendou mais um penalty. De novo o Pote avançou. E marcou: 2-0. Então, o objectivo do jogo passou a ser dar um presente ao Paulinho. O rapaz porfiou, porfiou até ser recompensado sob a forma de um... cartão amarelo - que grande 31! Pelo meio já o Sporting havia mudado meia equipa, entrando primeiro o Fresneda, o Matheus e o Hjulmand e depois o Diomande e o jovem Mamede, da nossa Formação. Se o espanhol voltou a passar ao lado do jogo, o dinamarquês destacou-se por aquilo que no rugby se chama o passe para o hospital: cadelas apressadas parem cachorros cegos, por isso talvez o Record pudesse fazer o favor a todos os Sportinguistas de não elevar o Hjulmand até onde Ícaro voou antes de cair no mar Egeu. É que há bajulações que se dispensam, especialmente antes de um derby na Luz onde precisamos de ter toda a gente consciente e concentrada no limite. Se foi pelas substituições ou por distração, a verdade é que o Rakow reduziu na sequência de uma bola parada a meio-campo, fazendo perigar a nossa vitória no jogo. Por isso, os últimos minutos foram de alguma tremideira, com muitas perdas de bola e a possibilidade mais académica do que real dos polacos empatarem a partida. Não aconteceu, para bem da nossa classificação na Liga Europa e moral para a Luz. 

 

Segue-se o Benfica, o clube da simpatia do chefe do governo que agora cai. Que seja um jogo sem casos! (É que o contrário seria um flagrante "de lítio".)

 

Tenor "Tudo ao molho...": Jeremiah St Juste ex-aequo com Daniel Bragança

 

P.S. O Lítio é um metal muito leve e flexível, ultimamente classificado como "petróleo branco".

sporting rakow.jpg

27
Out23

Tudo ao molho e fé em Deus

A tendência para a vitimização


Pedro Azevedo

Para um adepto, ver o Sporting na Liga Europa, enquanto os outros jogam para a Champions, é penoso. Para piorar o cenário, a fase de grupos da competição arrasta-se sem grande interesse, com muitas equipas do terceiro escalão europeu metidas nos potes 3 e 4, pelo que tem de se aguardar pela chegada da fase a eliminar para haver um pingo de entusiasmo. Porém, para um clube que no seu palmarés ostenta apenas uma taça europeia - Taça dos Vencedores das Taças -, a Liga Europa tem de ser encarada como uma oportunidade de começar a construir um prestígio europeu capaz de potenciar a marca Sporting. Deve haver por isso a ambição de a vencer, o que raramente encontra correspondência na forma bastas vezes equívoca como o clube comunica para o exterior as suas intenções na prova. Deste modo, parafraseando o poeta O'Neill, a Liga Europa é encarada como uma coisa em forma de assim. Ou de assim-assim, nesse meio caminho ficando nós quase sempre a meio de caminho nenhum, nem apostando forte na competição, nem poupando claramente os jogadores para o campeonato nacional. 

 

Dentro desse lote terceiro-mundista do futebol europeu, ontem calhou-nos o Rakow, um clube sem grande história no próprio futebol polaco mas com o presente de ser o campeão em título, aliás o único campeonato conquistado no seu palmarés. A nossa missão não se afigurava assim de grande grau de dificuldade, esparando-se nada menos do que uma vitória, com maior ou menor transpiração. Como base de sustentação disso, olhando para o Transfermarket - sempre tão chamado à colação quando enfrentamos emblemas de cotação superior -, o plantel do Rakow apresentava na antecâmara do jogo um valor de mercado de 38,65M€ contra os 280,30M€ da equipa do Sporting. Só que a mentalidade do clube desde meados dos anos 80 não ajuda e, quando as incidências do jogo não nos beneficiam, a tentação para vestirmos o papel de vítima impõe-se à heroicidade requerida para contornarmos os problemas. Um dia são os árbitros, outro o relvado, num outro dia uma expulsão, tudo serve de desculpa para o insucesso e está de tal maneira enraizado que se repercute no baixo nível de exigência. Ontem voltou a acontecer. 

 

Ainda não estavam decorridos 8 minutos de jogo e já Gyokeres era expulso. No actual contexto, perder o sueco não é só perder um jogador, é perder "O Jogador". Porque Gyokeres vem mostrando um andamento e atitude competitiva muito superior aos demais, o que levanta a sebastiânica esperança de que tal um dia possa vir a contagiar o resto da equipa de uma forma positiva. Pelo menos, seria bom que tal acontecesse. Mas o Gyokeres, que nos habituou a ser leal nos confrontos com os seus adversários, nunca ripostando às cargas à margem das leis que em todos os jogos sofre de uma forma corriqueira, calculou mal o tempo de entrada a uma bola protegida pelo seu adversário e foi negligente. Expulsão justa pelas actuais regras, embora não tenha havido intenção dolosa de aleijar o jogador polaco. Um contacto letal para a sobrevivência de Gyokeres no jogo, ou do outro lado não estivesse um Arsenic (coisas que a tabela... periódica explica). Com menos um, inicialmente o Sporting até reagiu bem: marcou 1 golo, teve 2 boas oportunidades por intermédio de Pote e conseguiu circular a bola durante bastante tempo. Só que depois as pilhas esgotaram-se demasiado cedo, que a componente física da equipa já de há uns tempos para cá não parece grande coisa e é sempre escondida com aquele paleio de treinador que em futebolês significa "controlo do jogo" e no fundo traduz-se em pouca exigência e incapacidade de manter ritmos altos - já dizia o Bobby Robson há 30 anos que ao Sporting faltava "killer Instinct" -, e depois a atitude dos jogadores e treinador também não foi a melhor, permitindo-se que a equipa baixasse demasiado o bloco, como se do outro lado em vez do Rakow Czestochowa estivesse o Bayern de Munique. Veio o golo do empate. E por pouco não acabou em derrota. 

 

A ideia que ficou foi a de que estivemos em Rakow com um olho no Bessa. Ou mesmo dois, que aquela segunda parte indescritível a deixar correr o marfim (com o Nuno Santos a entrar aos 89 minutos) assim o fez crer. Ainda assim, houve muitos jogadores abaixo dos mínimos olímpicos, com particular destaque para os alas, que defenderam mal e atacaram pior, com Esgaio inexistente ofensivamente e na origem do contra-ataque polaco que empatou a partida e Matheus incapaz de acertar um cruzamento ou de ler que o seu adversário directo era esquerdino e como tal invariavelmente iria puxar para dentro para centrar, algo que aconteceu com iminente perigo um ror de vezes. De resto, Paulinho foi uma nulidade (não há como pôr de outra maneira), o nosso meio-campo esgotou-se, salvando-se o nosso trio de centrais, claramente o mais sólido e consistente sector da equipa.   

 

Agora é ganhar no Bessa, a fim de justificar minimamente o desinvestimento feito neste jogo da Liga Europa. Bessa onde teremos de novo Gyokeres, esperando-se que a imprudência de hoje não ajude a criar uma imagem do sueco, nada consonante com a sua personalidade e carácter, capaz de o pôr na mira dos árbitros portugueses. Porque Gyokeres é, hoje por hoje, o nosso melhor jogador, e o jogo de ontem provou ser imprescindível quando é necessário sacudir a pressão do adversário e impor-lhe respeito. 

 

Tenor "Tudo ao molho...": Coates

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