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A Poesia do Drible

"Um pouco mais de sol - eu era brasa, Um pouco mais de azul - eu era além. Para atingir, faltou-me um golpe d'asa... Se ao menos eu permanecesse aquém..." - excerto de "Quasi", de Mário de Sá Carneiro

"Um pouco mais de sol - eu era brasa, Um pouco mais de azul - eu era além. Para atingir, faltou-me um golpe d'asa... Se ao menos eu permanecesse aquém..." - excerto de "Quasi", de Mário de Sá Carneiro

A Poesia do Drible

08
Jun25

Tudo ao molho e fé em Ronaldo

Mais uma noite na “Padaria da Brites”


Pedro Azevedo

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Quando, no longínquo ano de 1385, corria o tempo de El Rei D. João I, as tropas portuguesas enfrentaram o exército de João de Castela, em Aljubarrota, a bola do jogo estava então longe da forma redonda que hoje lhe conhecemos, antes possuía a geometria rectangular de uma pá, aliás tecnicamente manejada com brilhantismo pela padeira Brites, o nosso Cristiano Ronaldo da época. [A presença da dita Padeira no contexto da batalha é uma questão do for(n)o interno português, que ainda hoje permanece envolta em algum mistério.] Todavia, a comandar as tropas, já havia um treinador (D. Nuno Álvares Pereira), por sinal bem português, ou não tivesse sido essa batalha uma resposta às pretensões castelhanas de influenciar as decisões estratégicas lusas através do Conde de Andeiro. O Conde acabou defenestrado no Paço e o Condestável avançou para Aljubarrota com um esboço da Táctica do Quadrado a faiscar nas sinapses do seu cérebro. O resultado foi o que se viu. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades (como escreveu o Camões e cantou o Zé Mário Branco): não só o nosso herói dos tempos modernos alinha agora pelos árabes (Al Nassr) como quis o destino que, 640 anos depois, Portugal viesse a defrontar a Espanha na final da Liga das Nações de futebol com um espanhol no banco a entoar tão efusivamente o nosso hino que nem um patriota tuga nascido e criado no bairro de Xabregas, freguesia do Beato. Creio que é a isto que os mais cinicos denominam de Globalização. 

A qualidade dos nossos jogadores foi sempre tão grande que Portugal chegou até a dar-se bem no tempo em que em vez do Santo Condestável havíamos sido dirigidos pelo (Fernando) "Santos Contestável", pelo que a realidade de o Roberto ser tão contestado nas vésperas de defrontarmos a Espanha não poderia ser um dado determinante no desfecho do encontro. Muda-se o ser, muda-se a confiança e a bem da verdade havia que pesar também nos pratos da balança o grande conhecimento que os nossos internacionais tinham de "Nuestros Hermanos" e da sua forma de jogar inspirada em Cruijff e nos seus discípulos: Nelson Semedo e Trincão foram jogadores do Barcelona, Ruben Dias e Bernardo Silva são treinados por Guardiola já há alguns anos, Nuno Mendes, João Neves, Vitinha e Gonçalo Ramos haviam acabado de atingir o pináculo da consagração europeia com Luís Enrique e Cristiano Ronaldo foi o grande ícone do Real Madrid e o areal inteiro na engrenagem que impediu que a hegemonia catalã nessa fase tivesse sido total. Havia também o facto de o nosso Seleccionador ser espanhol, embora a sua predilecção pela flexibilidade táctica, também conhecida por experimentalismo, o aproximasse mais da linha de pensamento de alguns cineastas portugueses do que da escola de futebol do país vizinho, não constituindo assim  uma vantagem tão evidente para nós. 

Todo o mundo é composto de mudança. Enquanto Martinez contava a táctica aos seus jogadores, na impossibilidade física de D. João I estar presente, a dupla de M&Ms da República, Marcelo e Montenegro, de megafone ao punho e postura de cheerleading no Beergarden de Munique, arregimentava os foliões lusos que previamente ao jogo aí se concentravam. Marcelo avançou logo com um prognóstico de 3-0, arrancando alguns sorrisos e mostrando-se assim particularmente identificado com a Funzone onde se encontrava. Não se sabe se igualmente foi transmitir a mensagem ao balneário, mas o doping emocional aos adeptos ficou logo ali dado. [Não são só os jogadores, os adeptos também têm direito ao seu aquecimento, e se umas cervejas ajudam a inflamar o corpo e a alma, depois o presidente faz o resto.] 

Tomando sempre novas qualidades, Portugal foi sempre melhorando ao longo do jogo. Após um início sobre o fraco, penalizado com o primeiro golo da Espanha, a Selecção chegou ao empate numa grande arrancada de Nuno Mendes. Antes do jogo, os media espanhóis haviam projectado o jogo como um duelo geracional entre Lamine Yamal e Cristiano Ronaldo, mas esqueceram-se daquela assoalhada sita na algibeira do calção de Nuno Mendes onde Yamal morou durante todo o tempo em que esteve em jogo. Em cima do intervalo, a Espanha voltou a adiantar-se no marcador. Portugal entrou a perder no segundo tempo, mas Nuno Mendes não se conformou e cedo voltou a promover um desequilíbrio pela esquerda. A bola enroscou na perna de um adversário e aos 40 anos Cristiano Ronaldo compreendeu melhor o ponto de queda da bola que Cucurella e empatou o jogo. Com a entrada de Leão, sempre muito apoiado por Nuno Mendes, Portugal então superiorizou-se, efeito que se estendeu à primeira parte do prolongamento. Mas o que parece tão fácil nos pés de Ronaldo, e por isso é desvalorizado, foi difícil para Nelson Semedo e os demais, que não aproveitaram novas solicitações de Nuno Mendes, ontem em modo Bola de Ouro da France Football. Mas a justiça não foi feita ali, a segunda parte do prolongamento foi inconclusiva e tivemos de ir a penáltis. Aí Portugal não falhou nenhuma penalidade e Diogo Costa defendeu a de Morata. Seis anos depois, Portugal voltava a vencer a Liga das Nações, com o balzaquiano Ronaldo ainda e sempre parte do elenco. Um dia de festa portanto para uma grande maioria de portugueses mas também para os farmacêuticos do nosso país: o stock de Rennie e Kompensan esgotou, um facto nada insólito numa nação onde as poucas soluções são muitas vezes vistas como os grandes problemas. 

Tenor "Tudo ao molho...": Nuno Mendes

05
Jun25

Tudo ao molho e fé em Ronaldo

O jogo do gato e do rato


Pedro Azevedo

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Imaginem os jogadores alemães como uns carvalhos: altos, largos, duros e resistentes. Frondosos, também, pelo menos a avaliar pela "juba" de Woltemade. Dir-se-ia então, antes do jogo, que no plano físico eles estariam em vantagem. Todavia, nem tudo seriam más notícias: uma das características conhecidas da madeira (Madeira?) que se extrai deste tipo de árvore é a sua maleabilidade, o que para variar traduzir-se-ia numa vantagem para os portugueses, se porventura conseguissem levar o jogo para o plano dos duelos individuais onde poderiam manobrar uns adversários muito duros (de rins), mas ainda assim gigantes com pés de barro. Mas Portugal passou cerca de 1 hora a jogar um outro jogo, a tentar apanhar os alemães desprevenidos nas costas, com Nuno Mendes como o artífice preferencial do passe de ruptura em contra-ataque. Uma opção estratégica de Roberto Martinez pela entrega da posse que a pouca inspiração de Pedro Neto na hora da definição fez fracassar. Até que sofremos um golo à conta da brincadeira e teve de entrar o Vitinha, que logo começou a querer a bola para a esconder dos teutónicos, organizando o jogo e desenhando suaves traços de geometria que não tardaram a unir toda a equipa num carrossel que pôs à roda a cabeça dos pupilos de Nagelsmann. Por outro lado, com Conceição, Portugal ganhou o Speedy Gonzalez ideal para complementar esse jogo do gato e do rato. Sem um Sylvester do lado de lá que lhe desse luta, a Alemanha ainda tentou com o "gato" Félix (também têm um), mas, ainda que "na mecha" (Nmecha), este entrou só no fim e já não foi a tempo de evitar o sorriso na boca dos portugueses. Pelo que, sem oposição, o Conceição foi por ali fora até que se decidiu por um corte na bola para o qual Ter Stegen não teve remendo. E se o Nuno Mendes já havia sido importante na transição ofensiva, voltou a brilhar em ataque organizado: primeiro dando uma bola de golo a Ronaldo numa bandeja de prata que este deixou cair no chão, depois recebendo de costas e tabelando com Bruno Fernandes para ir buscar à frente e entregar novamente um presente a Ronaldo, que, à falta de um madeireiro que abatesse os carvalhos, foi na ocasião o madeirense que não se fez rogado. Uma vitória que poderia ainda assim ter sido mais ampla, se Conceição e Diogo Jota (outro rato atómico, entretanto entrado em jogo) tivessem aproveitado as várias oportunidades que existiram.  Valeu a classe de Ter Stegen aos alemães. 

Tenor "Tudo ao molho...": Nuno Mendes 

21
Abr25

A Clubite


Pedro Azevedo

Entre as moléstias estomacais dos adeptos da bola em Portugal, nenhuma é tão infecciosa, invasiva e transbordante como a azia provocada pela clubite. A clubite consiste numa inflamação nervosa altamente contagiante que tem o epicentro no estômago e rapidamente se propaga para a boca e dedos. Tanto se pode apanhar num estádio de futebol,  como no sofá e transmite-se oralmente ou por via de um teclado com acesso às redes sociais. Pior, não tem cura, ou a sua cura implicaria transladar todos os infectados para uma qualquer clínica de reabilitação de cultura desportiva sita em Inglaterra, um devaneio insular para tratar o que mais parece uma insolação que afecta a moleirinha dos contaminados. O custo seria incomportável para todos os outros contribuintes que desconhecem que a bola é redonda.

 

Não se nasce em Portugal com clubite, mas o meio ambiente e o contexto cedo (na adolescência) criam o caldo cultural para que ela se entranhe no indivíduo e nunca mais o abandone. Ao contrário das borbulhas, não há Clearasil que lhe acuda. O alvo principal da clubite é o árbitro, o que explica a razão porque durante muito tempo este só se vestiu de preto, como se assim fizesse o luto. Na mira estão também os dirigentes dos clubes adversários e às vezes até do próprio clube, especialmente quando a bola, que era suposto entrar, insiste em embater no poste. 

 

O adepto infectado com clubite odeia pelo menos tanto o(s) clube(s) concorrente(s) quanto ama o seu clube. É como se o amor ao clube do seu coração não lhe desse energia eléctrica suficiente para manter acesa a chama da paixão e precisasse do combustível fóssil do ódio para se sentir umas octanazinhas mais aconchegadito, um "yin" e um "yang" que celularmente estão simultaneamente presentes no diagnóstico da clubite. 

 

Ninguém vai à bola em Portugal por gostar de futebol, o que é como quem diz, ninguém em Portugal "vai à bola" com o futebol. Para isso escolhem-se países "bárbaros" como a Inglaterra, que fazem uma festa para nós inexplicável à volta do jogo. Não, em Portugal gosta-se do clube, ponto. Aliás, 3 pontos, jornada a jornada, porque a clubite alimenta-se das vitórias. E das derrotas, dos nossos adversários (esse também é um ponto, ainda que paradoxalmente signifique zero pontos). E de sofrer. O jogo em si pouco importa, os jogadores idém, o importante é o penalty que não foi e o que foi e o malandro do árbitro não marcou. É o ruído que alimenta a paixão, não é a paixão pelo jogo que sustenta o amor ao clube. Assim, uma época de futebol não é uma temporada feliz, antes sim tormentosa. O masoquismo subordinado a uma forma redonda. Felicidade só mesmo no fim, no Marquês ou Aliados, se o nosso clube ganhar o campeonato. Aí, sim, vem a comunhão e sentimo-nos parte de algo muito superior à nossa própria existência. Celebramos com os nossos e por um dia suspendemos a clubite. No dia seguinte, no escritório ou no barbeiro, voltamos à primeira forma, que a hora é de achincalhar o adversário perdedor. Porque a vingança é um prato que se serve frio, e neste nosso futebol não há honra para os vencidos. Por isso, a história do jogo em Portugal é (re)escrita pelos vencedores e só ganhar importa. Além não há nada, muito menos futebol. 

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16
Abr25

E a APAF não “referee” isto?


Pedro Azevedo

Em 117 árbitros, auxiliares e VARs escolhidos para o Mundial de Clubes, Portugal ficou excluído do lote de 41 países que far-se-ão representar. Entre estes marcará presença El Salvador, aquele país que aqui há uns dias o Jorge Jesus, na sua proverbial jactância, questionou se teria futebol. É mais um sinal claro e inequívoco da falta de qualidade da arbitragem portuguesa, ainda que muitos queiram agora associar-se ao velório criado a partir da não eleição de Pedro Proença para o Comité Executivo da UEFA. Para essas "viúvas", relembro apenas que já no tempo de Fernando Gomes era frequente os árbitros portugueses ficarem fora das maiores competições internacionais de selecções. E a APAF (e o Conselho de Arbitragem) não "referee" isto? Talvez fosse bom meditar sobre os factos (e não apenas suposições). 

24
Mar25

Tudo ao molho e fé em Ronaldo

Trincão deu asas ao sonho na Vespa de Jota


Pedro Azevedo

Ao contrário do que por vezes Roberto Martinez nos quer fazer crer, uma Selecção não pode ser vista como um clube mais ou menos enclauserado em estágios, na medida em que a experiência e momento de forma de um jogador provêm essencialmente da sua utilização no(s) clube(s) e não na Selecção. Só assim aliás se explica aqui a teoria da Tábula Rasa, do filósofo John Locke, que defende que o Homem nasce como uma folha em branco e todo o seu conhecimento deriva da experiência, tentativa e erro. Por isso, tanto Ronaldo, o decano nestas andanças da Selecção, como Trincão, um neófito, mostraram serem conhecedores e foram importantes no resultado final, tendo o Sportinguista sido mesmo absolutamente decisivo ao marcar dois golos e idealizado outro, servindo esta dicotomia para provar o quão errado tem estado Roberto Martinez ao excluir das primeiras opções jogadores como Pote, Gonçalo Ramos ou Quenda com o argumento de que não estiveram em alguns estágios ou têm pouca experiência na Selecção. Porque se a experiência na Selecção do Cristiano Ronaldo é equivalente a todos os tomos da Enciclopédia Luso-Brasileira, a do Trincão era até ontem igual à de uma folha de papel cavalinho ainda por preencher. O curioso é que, se Ronaldo comprovou a teoria de Locke ao falhar primeiro (tentativa-erro) para depois evoluir com dois golos (um anulado por fora de jogo milimétrico anterior de Leão) e um par de outras oportunidades negadas por boas defesas de Kasper Schmeichel, mostrando que mesmo aos 40 anos continua a adquirir um conhecimento que depois lhe permite dar a volta a situações adversas, já o Trincão não precisou do erro, pois concretizou todas as tentativas, pelo que o seu conhecimento adveio essencialmente da experiência acumulada no Sporting.  

Portugal deu 1 hora de avanço à Dinamarca devido a Martinez ter mantido em campo um jogador sem compromisso como Rafael Leão em detrimento de Diogo Jota. Além da moto, Jota trouxe intensidade nos duelos ofensivos e defensivos. Enquanto Leão pedia a bola no pé e sem ela alheava-se do jogo, Jota procurou o espaço, foi buscar metros de comprimento nas costas da defesa nórdica e envolveu-se em inúmeras batalhas pela posse da bola (meão e com uma cinturinha de vespa, é incrível a luta que dá aos adversários). No dia em que Bernardo Silva (excelente exibição) realizou o seu centésimo jogo pelo seleccionado português, Gonçalo Inácio foi um dos melhores em campo, sobreponde-se mesmo a Rúben Dias (teve um erro comprometedor) como patrão da nossa defesa. Bom jogo também de Nuno Mendes, mas o destaque individual tem de ir para Trincão, que se revelou exímio na definição, quer no passe que isolou Jota no quinto golo como nos remates que primeiro nos voltaram a colocar dentro da eliminatória e depois nos puseram por cima. Tudo isto porém não teria sido possível se Diogo Costa não tem ganho tempo na Dinamarca para que Portugal, em Alvalade, pudesse dar a volta aos Vikings.

Uma nota especial para Cristiano Ronaldo: foi um verdadeiro capitão. Na Conferência de Imprensa que antecedeu o jogo, enquanto esteve em campo (exortando frequentemente o apoio das bancadas) e após ter sido substituído (estimulando sempre os colegas), continuando a fazer tábula rasa aos "haters". 

Portugal não foi a única selecção a necessitar de prolongamento para carimbar a passagem à fase decisiva da Taça das Nações, pois Espanha (contra os Países Baixos) e França (face à Croácia) precisaram até de ir a penáltis, mas acabou por ser a que passou com maior margem de golos. Segue-se a Final Four, na Alemanha, com uma meia-final em que defrontaremos a equipa da casa, uma nova prova de fogo para Martinez porque não haverá uma segunda oportunidade para deixar uma boa impressão final.  

Tenor "Tudo ao molho...": Trincão 

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21
Mar25

Tudo ao molho e fé em Ronaldo

Bob, o Construtor... de ilusões (ou a depressão Martinez)


Pedro Azevedo

O Roberto Martinez nunca comete o mesmo erro duas vezes. Não, pelo contrário, descobre sempre novos erros para cometer. Se insistisse no mesmo erro seria um teimoso, assim é um criativo. Da asneira. A equipa não foi intensa, perdia a bola com facilidade, na frente os jogadores pediam a bola no pé e não no espaço, ninguém se desmarcava, mas, ainda que constatando tudo isso, o senhor Martinez diz que houve atitude. Estamos muito mais descansados! Para Martinez, o Vitinha é o melhor médio da Europa e o Ronaldo um dos melhores pontas de lança actuais. Depois há o Nuno Mendes, um dos melhores laterais esquerdos do mundo, Bruno Fernandes, um médio extremamente goleador, Ruben Dias, um xerife da defesa, e João Neves, grande revelação do futebol mundial dos últimos anos. Então, porque é que Portugal joga tão pouco, ao ponto de Diogo Costa ter sido o melhor em campo? Não será pelos jogadores, certamente. Também não será crível que a culpa possa ser assacada ao médico ou fisioterapeuta. Nem ao roupeiro. Mesmo o Pedro Proença, que sempre achei fraco, não teve ainda tempo suficiente no cargo de presidente da FPF para cometer erros (um situacionista foge da audácia como um gato da água, não vá a ousadia impedir que salve o pêlo), apesar de eu ter estranhado em véspera de um jogo importante os jornalistas terem perguntado aos jogadores sobre José Mourinho. Assim, a resposta parece-me tão óbvia quanto as consequências da Depressão Martinho (ou será Martinez?): o maior culpado chama-se Roberto Martinez. Ele vê coisas que mais ninguém enxerga. Mas não é visionário quem quer, só quem pode, algo estritamente reservado a génios. Ora, génio é coisa que o sedutor Martinez, sempre tão desejoso de agradar, não é. Por isso, o nosso avançado mais fiável que joga lá fora e com melhores números em campeonatos dos Big 5 (Diogo Jota), um explorador por natureza do espaço, na Selecção do senhor Martinez tem como destino a suplência. Da mesma forma que o médio com maior participação em golos em Portugal nos últimos 4 anos (Pote) quase nunca calçou. Para não falar de outro patinho feio para o Seleccionador (Matheus Nunes), cuja envergadura, aceleração com bola e capacidade de quebrar linhas são características desprezadas por Bob, o Construtor... de ilusões. Enfim, admita-se, não é um titular indiscutível do City, mas então por que razão o Félix tem lugar cativo nas escolhas de Roberto? Aparentemente, porque faz muito bons estágios. Tal como um bom whiskey, pelo que daqui a uns 12 ou 15 anos estará no ponto. No malte, ou Malta, depois de todos os treinadores que insistiram ad-nauseam nele terem tido de empenhar os anéis para salvarem os dedos. Esses estarão todos errados, o Martinez é que está certo. Lembro-me de ver algo semelhante na tropa, em que o passo trocado era sempre de todos os outros e nunca do próprio. Ainda assim, face ao ocorrido em Copenhaga, a derrota pela diferença mínima foi um bom resultado, na medida em que deixa em aberto para Alvalade a possibilidade de uma reviravolta. Apesar de Martinez. Pelo que terão de ser os nossos jogadores a dar dois passos atrás e não um à frente na direcção do precipício. Até porque já não há o João Pinto é só ele sabia como flutuar sobre o vácuo ou atirar a bola contra o próprio poste para evitar um canto. Canto do cisne? No Domingo se verá. Mas há qualidade para melhor. Muito melhor. De preferência, sem estágios onde os nossos jogadores desaprendam o que sabem. Se é para jogarmos como na Dinamarca, então eu prefiro o Ramos, abstinente em estágios mas competente nos apoios frontais e na procura da profundidade, uma muleta ideal para o Jota. E o Quenda. Porque ninguém está errado por fazer as coisas certas, mas Martinez nunca estará certo se continuar a fazer tudo errado. Por muito que tenhamos grandes jogadores, que um fraco rei (Momo) faz fraca a forte gente. Já dizia o Camões, um visionário a quem bastou um olho para ver o que Martinez não descortina com os dois olhos bem abertos. 

 

"A cada bela impressão que causamos, conquistamos um inimigo. Para ser popular é indispensável ser medíocre." - Oscar Wilde

 

Tenor "Tudo ao molho...": Diogo Costa

 

P.S. Ao contrário de alguns, eu creio que o Ronaldo ainda pode ser útil à Selecção, O que não entendo é que Martinez, mais ainda após ter dito ver o Ronaldo actual como um avançado estritamente de área, depois lhe peça para descer entre-linhas e construir a partir daí. 

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18
Mar25

Eu show Roberto


Pedro Azevedo

A Selecção de Portugal regressa ao activo e essa é uma grande oportunidade de voltarmos a ouvir o senhor Roberto Martinez. Confesso que é um momento que, aguardo com o mesmo estado de espírito com que espero o programa semanal do Ricardo Araujo Pereira. Porque é humor a valer, um non-sense ao nível do melhor que se faz em Inglaterra, a pátria que imortalizou o género com os seus Monty Python, Rowan Atkinson ou Benny Hill. O que eu me ri quando o Roberto afirmou que a Selecção servia para recuperar jogadores (Cancelo e Félix) para os clubes ou que um jogo a feijões não proporcionou a estreia de Quenda! Ou que o melhor médio da Liga em 4 anos consecutivos (Pote) "teve azar" e o João Félix "é muito forte nos estágios". Como Deus também tem imenso sentido de humor, em consonância o Pote ficou em casa e o Félix falhou o penalty que nos afastou no Europeu. Nada porém que demovesse ou tivesse feito pensar o sr. Martinez. Desta feita viémos a saber que o Tomás Araujo estava fora da convocatória por ter uma "lesão crónica". Poucos dias depois jogou pelo Benfica, em Vila do Conde, pelo que talvez a lesão seja da honra (do Seleccionador). Se será crónica ou não, só o futuro o dirá. Vamos ver então o que valerá este estágio de Março nas contas finais da Liga das Nações, sabendo nós que o de igual mês do ano passado foi determinante para o elenco final do Euro-2024. Mas o mais provável é que o nosso Seleccionador venha a criar uma outra narrativa, que o seu sentido de humor dificilmente não prevalecerá sobre a coerência na justificação dos critérios que presidem às suas escolhas. Segue-se então a Dinamarca, pátria de um certo cavaleiro que inspirou Shakespeare. Nada que preocupe Martinez, certamente mais próximo do género Blackadder ou Em Busca do Cálice Sagrado, que montado num lote de jogadores invejáveis decerto confiará que os nórdicos não farão Hamlets sem ovos tão bons como os nossos. A caminho da Final Four, uma nova oportunidade para assistir ao show do Roberto. bob3.jpg

18
Fev25

Parabéns, Carlos Lopes!!!


Pedro Azevedo

O maior, o mais completo, o campeoníssimo Carlos Lopes completa hoje 78 anos. Dominador no corta-mato (três medalhas de ouro e duas de prata em Mundiais), pista (medalha de prata nos J.O. Montreal e ex-recordista da Europa, nos 10.000 metros) e estrada (medalha de ouro, na maratona, nos J.O. Los Angeles), Lopes foi um atleta que se caracterizou pela vontade indomável de superação de todos os obstáculos que se lhe deparassem, fossem eles psicológicos ou observáveis no terreno (os desníveis no solo e a lama no "cross", as sucessivas curvas para a esquerda na pista, os longos 42 km na maratona). Carlos Lopes foi também o primeiro campeão olímpico português em qualquer modalidade, quebrando também aí uma barreira mental e abrindo assim novos horizontes aos nossos atletas. Produto da escola de atletismo que o Professor Mário Moniz Pereira (outra grande figura do desporto nacional) montou em Alvalade, Lopes é provavelmente o maior símbolo do Sporting Clube de Portugal. Um símbolo vivo, que importa continuar a homenagear em vida. Muitos Parabéns, Carlos Lopes, e obrigado por tudo!

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20
Nov24

Póqueres, lobos e cordeiros


Pedro Azevedo

Suspeito que se Vik "Thor" Gyokeres (ou será Póqueres?) fosse português, Roberto Martinez inundá-lo-ia de elogios e no final do dia poria o Fábio Silva como titular. Porque afinal há uma afinidade clara entre o Fábio Silva e o Sr Martinez: são ambos lobos (o Fábio é do Wolves, mas está emprestado ao Las Palmas). Porém, há uma não tão pouco subtil diferença: só o Roberto veste a pele de cordeiro (o símbolo do Las Palmas é um castelo e... um leão rampante). 

19
Nov24

Tudo ao molho e fé em Ronaldo

Remar, REMAX (aos Chutos&Pontapés)


Pedro Azevedo

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Sabemos que o mundo é um lugar estranho quando, em pleno "Century 21",  Portugal vai a Split jogar contra a equipa da REMAX (Hrvatska, em croata). É a força da globalização e suas tendências, ainda que paradoxalmente as pessoas andem bastante mais separadas ("Split", na língua global) umas das outras, entretidas a brincar às casinhas. 

Portugal entrou com tudo, com João Neves a marcar o ritmo, Vitinha a esconder a bola, Tomás Araújo imperial com e sem bola e Nuno Mendes omnipresente como central pela esquerda, lateral ofensivo e extremo canhoto. Só o Rafael não apareceu no seu melhor,  no caso em versão emplastro Leão, o que rima com trapalhão (só na definição). O céu parecia ser o limite, o que até é, curiosamente, um slogan caro aos da REMAX, mas muita parra produziu pouca uva e ao intervalo vencíamos por apenas 1 golo de diferença, cortesia de João Félix e de um daqueles seus detalhes de génio da lâmpada que um dia (sebastianismo puro luso) lhe valeram uma transferência de 120 milhões. O problema do João é que o seu perfume requintado coabita num frasco de 25ml, esgota-se em pouco tempo. (Para quem vê o futebol como arte, o delicado entrelaçar de jogo que nasce no seu cognito e logo floresce nos seus pés capta a atenção como se de uma bela e complexa peça de filigrana se tratasse. Não é só o que se vê, é muito também o que se sente: o som perfeito que a bola emite quando por ele impelida, o perfume requintado derramado no acto, a intenção que quase conseguimos tocar latente em cada sua acção, a água que nos cresce na boca como que a pedir sempre mais. Tudo isto nos acontece porque Félix é um dos raros futebolistas que nos despertam os cinco sentidos. Porém, e apesar de todos os predicados, a carreira de Félix tem ficado aquém. Porque não só de talento se faz um caminho, é preciso trabalho, consistência e atitude mental. E é especialmente nesta última que as coisas falham.)


Depois de uma muito boa primeira parte, na segunda perdemos a objectividade: escondermos a bola passou a ser a meta, ao invés de continuarmos a procurar o golo. Foi assim um tempo de espera: esperámos pela REMAX e esperámos por Godot. É normal em Portugal se esperar por Godot, os portugueses estão habituados a esperar e suspirar até por aquilo que nunca vem. Talvez por isso não reajam bem a quem entrega o que promete, gente como o Cristiano Ronaldo e assim, que como tal nem sempre é bem-vista ou bem-quista. No dia, o nosso Godot chamava-se Quenda, Geovany Quenda, e não havia noticiário prévio ao jogo que não anunciasse a sua estreia oficial pela Selecção, estreia essa que bateria o recorde de precocidade pertencente a Paulo Futre. O problema é que, tal como na peça de Beckett, o Quenda nunca chegou. Na antecâmara do jogo haviam 4 potenciais estreias lusas. Dessas quatro, a do Tomás Araújo logo se confirmou (foi titular). Depois entraram o Tiago Djaló, recém-titular de uma defesa do Porto que mete mais buracos que uma balsa a remos de dissidentes cubanos prestes a naufragar ao largo da Flórida, e o Fábio Silva, que anda de clube em clube a ver se alguém lhe dá a mão (ou, pelo menos, lhe mostrem as palmas das mãos, "Las Palmas"). Já foi "Ranger" e até vestiu a pele de Lobo (Wolves), mas quem lhe deu verdadeiramente a mão veste a pele de cordeiro (Martinez). Pelo que o Quenda foi o único que não saiu do banco, dali ficando a ver todas as expectativas criadas pelo próprio Seleccionador gorarem-se, frustrarem-se, o que já não é a primeira vez. Ainda que vendo o Semedo facilitar no golo da REMAX, um golo muito antecipado como outros no passado que resultam da inação face aos acontecimentos tão comum ao nosso Seleccionador, o homem que desperdiçou a melhor geração belga desde a ínclita dos anos 80 e se prepara para fazer o mesmo, se lhe derem tempo, com Portugal. Como também já é um hábito, o Trincão não saiu do banco, passou de afluente no último jogo a não influente neste, o que ilustra bem a (in)coerência de consistência das decisões do treinador. Tudo isto, porém, obedece a um plano estratégico genial por parte de Roberto Martinez, o melhor aliado do Sporting no presente campeonato: é que os nossos jogadores saem da Selecção com tanta fome de bola que depois comem a relva nos compromissos domésticos. Creio que assim deveremos estar muito agradecidos ao Sr Martinez, rezando para que ele não saia para uma REMAX, que até seria um fato à sua medida visto que exige exclusividade no seu portefólio de activos.

 

"Mares convulsos, ressacas estranhas
Cruzam-te a alma de verde escuro
As ondas que te empurram
As vagas que te esmagam
Contra tudo lutas
Contra tudo falhas

Todas as tuas explosões
Todas as tuas explosões
Redundam em silêncio
Redundam em silêncio
(2x)
Nada me diz

Berras às bestas
Que te sufocam
Em abraços viscosos
Cheios de pavor
Esse frio surdo
O frio que te envolve
Nasce na fonte
Na fonte da dor

Remar remar
Forçar a corrente
Ao mar, ao mar
Que mata a gente
(2x)

Nada me diz"

 

Tenor "Tudo ao molho...": Nuno Mendes 

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