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A Poesia do Drible

"Um pouco mais de sol - eu era brasa, Um pouco mais de azul - eu era além. Para atingir, faltou-me um golpe d'asa... Se ao menos eu permanecesse aquém..." - excerto de "Quasi", de Mário de Sá Carneiro

"Um pouco mais de sol - eu era brasa, Um pouco mais de azul - eu era além. Para atingir, faltou-me um golpe d'asa... Se ao menos eu permanecesse aquém..." - excerto de "Quasi", de Mário de Sá Carneiro

A Poesia do Drible

19
Fev25

Tudo ao molho e fé em Gyokeres

Missão Impossível?


Pedro Azevedo

"Look at the starsLook how they shine for you" - Yellow (Coldplay)

 

Jogar no Signal Iduna Park (Westfalenstadion) é estar num relvado cercado de amarelo por todos os lados. Os adeptos do Dortmund são provavelmente os mais entusiastas da Europa e fazem de cada jogo uma experiência única. O Sporting hoje fez parte dessa experiência, procurando não ser a cobaia. Passar a eliminatória era uma missão à partida impossível, com três teenagers (Quenda, Simões e Harder) a tentarem fazer de Tom Cruise (mais tarde também Alexandre Brito e Afonso Moreira, que Lucas Anjos já tem a enormidade de 20 anos). Muitos jovens a olharem as estrelas do Borussia Dortmund e a sentirem o brilho da Liga dos Campeões. 



Para ainda dificultar mais a nossa missão, muito cedo se percebeu que João Simões e Hjulmand, os dois médios centro do sistema de 3-4-3 que Rui Borges recuperou (com o Arouca, após a entrada de Harder, o Sporting atacou pela primeira vez em 4-4-2, pelo que a escassez de médios promete pôr de lado as várias nuances de 4-3-3 anteriores), tornaram-se as mais recentes vítimas da conspiração universal contra a nossa Unidade de Performance (o "azar"). Se a qualificação para a fase seguinte seria a sorte grande e a vitória no jogo o segundo prémio, o Sporting teve de contentar-se com a terminação (não perder). Ainda assim, valeram-nos as exibições de Eduardo Quaresma e do guarda-redes Rui Silva, dois rochedos que encravaram a engrenagem da máquina alemã. Quaresma esteve soberbo, imperial até. Foram inúmeras as vezes em que desarmou adversários dentro ou nas imediações da área leonina, assim como incontáveis as ocasiões em que surgiu como pronto-socorro a equilibrar o que já estava desordenado. Se não calar hoje a boca de analistas tão condescendentes e coniventes com a mediocridade e simultaneamente tão obstinados em lhe apontar o dedo ao mínimo erro, então isso simplesmente nunca ocorrerá. Mas teve uma única falha, na leitura da linha de fora de jogo, e isso deverá servir de bálsamo à usual narrativa de quem embirra com ele. Uma coisa é certa, no 1x1, por ele ninguém passou, foi um colosso, tanto que meteu o Gittens no bolso e este já nem voltou do intervalo. E é, indiscutivelmente, um grande jogador, um jogador à Sporting, com muita técnica, velocidade e força nos duelos, à espera de finalmente ser uma aposta consistente de um treinador leonino para se afirmar definitivamente. Em grande esteve também o Rui Silva, que até um penalty defendeu, entre outras três paradas de grau de dificuldade elevado. Temos "Keeper"! Fora deste duo, a equipa revelou limitações. Por exemplo, o "Menino do Rio", formado no Fluminense e proveniente do Bahia, mostrou um futebol que se esgota dentro de uma caixa de fósforos, sem acesso à parte de fora para causar uma fricção capaz de fazer lume - um(a) Biel(a) incapaz de dar vida a um motor. Esgaio empenha-se séria e profissionalmente mas é curto, Inácio está em muito má forma e falha muitos passes, Harder viu-se sozinho e teve de lutar muitas vezes contra 2 ou 3 adversários. Os substitutos estiveram bem melhor: Alexandre Brito, após um início nervoso, fez o nosso primeiro remate com perigo, Afonso Moreira revelou personalidade com bola e bons pormenores técnicos, Lucas Anjos deu-se à luta como se estivesse a jogar com o 1º de Dezembro e Maxi mostrou a qualidade habitual com bola e uma boa noção dos tempos de jogo. 

Enfim, não foi a "Missão Impossível", mas pelo menos não houve "O Silêncio dos Inocentes". A longa-metragem a que assistimos teve título e sub-título intermédios, uma "Missão para Inocentes" (jovens) atrapalhada pelo "Silêncio Impossível" que pode haver à volta da catadupa de lesões que nos assolam. Ainda assim um filme com um razoável "box office", aquele que com 1 ponto conquistado é garantido pela UEFA. 

Tenores "Tudo ao molho...": Eduardo Quaresma e Rui Silva, ex-aequo. 

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30
Jan25

Tudo ao molho e fé em Gyokeres

Portugal na CEE


Pedro Azevedo

Estávamos no início dos anos 80 e os GNR cantavam "Portugal na CEE": "Na rádio, na TV, nos jornais, quem não lê..." A CEE mais tarde deu lugar à União Europeia. E alargou-se, dispersando os seus membros, de uma forma diferente da antiga Taça dos clubes Campeões europeus, que se transmutou na Liga dos Campeões que hoje conhecemos, concentrando o poder nas grandes ligas. Por isso, a Champions é hoje uma competição sui-generis, por conter uma maioria de clubes que não foram campeões (dos 24 clubes apurados para a próxima fase, só 9 venceram o campeonato do seu país na época anterior e alguns, como a Atalanta ou o Brest, nunca foram sequer campeões nacionais na sua história). Mas o negócio dita a lei, os patrocinadores querem ver as melhores equipas no momento, pelo que se atropela o conceito básico, mistura-se com uns pózinhos de perlimpimpim do Zadok the Priest (Handel) para dar solenidade à coisa e coroa-se assim o fim de clubes históricos como o Anderlecht, o Ajax, o Estrela Vermelha ou o Steaua de Bucareste, muito periféricos para a alta-roda dos milhões que a UEFA quer explorar até ao tutano, que o osso fica para os orfãos deste modelo de "desenvolvimento". 

 

Calhou o sortilégio do sorteio que o futuro de Sporting e Benfica na competição estivesse dependente do seu desempenho contra equipas italianas: o Benfica ia a Turim tentar trocar três passes seguidos para saltar à próxima fase e assim o Lage poder fazer a sua festa de garagem, o Sporting precisava de ratificar um Tratado de Bolonha que conviesse a ambas as partes. A tarefa dos Leões não era fácil, que recentemente, haviam trocado Alcochete por Alcoitão, que é como quem diz um centro de estágio por outro de medicina de reabilitação. Já se sabe que tirar um curso superior tendo por companhia um par de muletas em vez de manuais pode ser incomodativo, mas a realidade era essa e os Leões teriam de procurar o melhor aproveitamento. Sem três dos seus quatro melhores "estudantes" (Gyokeres, Pote e Morita de fora, só Hjulmand foi a exame) e com um "cábula" como Fresneda a baixar a média geral da turma - aos 2 minutos, num canto, deixou-se antecipar por Sam Beukema e a bola foi à trave; aos 17, Samuel Iling fez o que quis dele e cruzou com muito perigo; aos 20, novo canto, Beukema novamente vence-o nos ares, Hjulmand já não chega a tempo para o compensar, a bola sobra para Pogeba e golo do Bolonha (Israel ficou como habitualmente entre os postes, como se estes para si representassem um cativeiro do qual fosse impossível libertar-se) - , o Sporting precisou de recorrer aos alunos mais jovens (Simões e Quenda) para obter um suficiente na prova. 

 

A entrada do miúdo João Simões permitiu criar um par de combinações pela esquerda com Maxi, conjuntamente com Diomande um dos mais inspirados em campo, que desestabilizaram os italianos. E de uma jogada que deve ter deixado orgulhoso o nosso Jorge Theriaga, decano do bilhar às três tabelas leonino, Simões passou a Harder (outro adolescente) e este fez uma carambola do seu pé esquerdo para o direito que pôs a bola no "saco" e o quezilento Bolonha (29 faltas!!) finalmente no bolso (pocket). O miúdo quase repetiu a proeza momentos depois, optando desta vez por um passe atrasado, mas o lance perder-se-ia por interferência de um bolonhês. 

 

Como o Benfica ganhou à Juventus, os dois clubes portugueses entraram no play-off. Há agora 24 clubes ainda em prova, sendo que apenas 6 pertencem a países periféricos que resistem ao jugo das ligas alemã, inglesa, espanhola, italiana e francesa. Nesse particular, Portugal rivaliza com os Países Baixos (também com 2 clubes, PSV e Feijenoord), os outros são Escócia (Celtic) e Bélgica (Club Brugge, o último apurado). 

 

"E agora que já lá estamos, vamos ter tudo aquilo que desejamos: um PA p'ras vozes e uma Fender. Oh, boy, é tão bom estar na CEE! Quero ver Portugal na CEE, quero ver portuga na CEE." - as vozes ficam para o Lage, a nós compete-nos ter unhas (garras de leão) para tocar esta guitarra. 

 

Tenor "Tudo ao molho...": João Simões

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22
Jan25

Tudo ao molho e fé em Gyokeres

A Leste nada de novo


Pedro Azevedo

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Ainda sou do tempo em que em Leipzig havia um clube com o nome de Lokomotiv. Mas depois o Muro caiu, os grandes clubes da RDA (Lokomotiv, Carl Zeiss Jena e o Magdeburgo do nosso descontentamento, que nos eliminou com muita sorte à mistura naquela meia final da Taça das Taças que terminou na véspera da Revolução de Abril) empalideceram com a migração de jogadores para o "el-dorado" Oeste (também há quem diga que o laboratório da Alemanha de Leste que fabricou atletas fabulosos como a Marita Koch abusava de aditivos hormonais, que o importante era promover a qualquer preço um regime que ia já remendado ou mesmo nu) e mais tarde apareceu o Red Bull, que como se sabe "dá-te asas" e portanto não é compatível com locomotivas que não voam, ou só voam se o observador estiver sob influência daqueles cogumelos que não são venenosos mas alucinam um bocadinho. Red Bull que logo estabeleceu uma linha de produção em Salzburgo para depois montar o produto final em Leipzig, produto esse que agora exporta na Europa. Foi nesse contexto que o Sporting visitou hoje a Alemanha. 

O Sporting entrou assim-assim, embora o Harder cedo tenha demonstrado estar com raivinha nos dentes. Só que, após uma bola perdida a meio campo, os centrais recuaram porque a bola estava descoberta mas o Fresneda foi de arranca-e-pára até ao estampanço final: 1-0 para o Red Bull. (Os Monty Python diziam que ninguém pára a Inquisição Esoanhola, mas o Leitor aguarde que pior ainda viria a ser o Canhão da Nazaré.)


O Fresneda voltou a falhar, mas desta vez o Sporting foi salvo pelo VAR que detectou um fora de jogo posicional de um jogador que depois acabou por ter interferência no lance. O Sporting começou a atacar mais e Harder, Fresneda e Debast viram bolas que iam a caminho da baliza dos alemães serem deflectidas. O intervalo chegou. 

O início do segundo tempo foi de pesadelo. Mas era preciso resistir o suficiente até que o Gyokeres pudesse entrar. A hora a que o Gyokeres pode entrar é uma coisa que tem a ver com a Unidade de Performance, uma entente criada do cruzamento feliz entre a Alcina Lameiras, o Detective Correia, o Instituto de Socorro a Náufragos e o Borda d'Água, também capaz de planear a sementeira para Janeiro e de prever as colheitas de Maio, prognosticar ventos e marés e resgatar moribundos. além de realizar investigações ao domicílio (Alcochete). O certo é que o Gyokeres lá entrou e cedo marcou, como seria de esperar de um jogador que, se faz a diferença para os adversários, está uma milha à frente de qualquer outro jogador do Sporting (exceptuando talvez o Pote). Com o golo, a qualificação estava encaminhada. Mas havia ainda a possibilidade de ficarmos nos 8 primeiros da Liga dos Campeões, desiderato para o qual seria imperioso vencer já hoje e posteriormente contra o Bolonha. Só que o Inácio encheu-se de salamaleques e não despachou uma bola que andou a ressaltar de cabeça em cabeça, de pé em pé, até que encontrou a canela do Esgaio, que é da Nazaré mas não é de todo O Nazareno, nosso salvador. Se bem que com ele o nosso caminho se tenha tornado uma Via Crúcis. Nada porém que desencoraje um Sportinguista, habituados que estamos a resistir a cataclismos que não estão descritos na Bíblia. 


A Leste nada de novo: o Gyokeres é o Gyokeres, assim como o Fresneda é o Fresneda e o Esgaio é o Esgaio, embora à laia de Prozac gostemos de pensar que os últimos 2 são o Cafu. 

Tenor "Tudo ao molho...": Vik Thor Gyokeres (Who else?) 

11
Dez24

Tudo ao molho e fé em Gyokeres

A Lei de Lavoisier


Pedro Azevedo

Na apresentação de João Pereira, o presidente do Sporting afirmou que iríamos vê-lo num colosso europeu dentro de 4 anos. Logo as más línguas o contestaram, alegando que a afirmação era ousada e até criadora de uma pressão adicional completamente desnecessária, na medida em que o treinador tinha um currículo incipiente e tudo a provar, mas Varandas mais uma vez provou ser um visionário: é que sendo o Guardiola o exemplo a seguir no que toca à tarefa de treinar colossos, o João Pereira está quase a igualá-lo (o catalão perdeu recentemente cinco jogos consecutivos e o JP já vai em quatro). [Ainda vamos descobrir que o treinador Rúben levou consigo o presidente Amorim e que no fim todos ficaram a perder, porque no United o Amorim precisaria de presidir para ter sucesso e no Sporting o Frederico necessitaria que o Rúben treinasse para que ele pudesse brincar aos presidentes sem grande dolo para a instituição.] 

 

A única coisa de que não gostei na referida apresentação foi que o nosso presidente se referisse a outros clubes que não o nosso como colossos. Porque, pelo menos para mim, o Sporting é um colosso. Ou era, até há duas semanas, antes de perder 4 jogos em 15 dias. E, se calhar, voltará a sê-lo, daqui a 4 anos, quando o João Pereira regressar a Alvalade depois de uma passagem pelo Braga como tirocínio para o sucesso. A ser assim, mais uma vez Varandas mostrará ser um oráculo. E as televisões voltarão a repetir ininterruptamente aquele dia em que o nosso presidente anunciou que João Pereira daria treinador. 

Um Sportinguista aguenta quase tudo, mas quando os treinadores começam com a ladainha do "levantar a cabeça" para mim é como se estivessem a anunciar o mau tempo. Vai daí, o Quaresma tanto levantou a cabeça que foi parar ao hospital. Outra coisa que me enerva no clube são as razões de cada um, quando a única razão relevante é a do clube. O problema é quando todos os adeptos têm razão e o clube não. Aí algo terá de ser feito, porque o clube não pode ser o oposto da unanimidade dos seus adeptos. A não ser que se queira um clube sem adeptos, o que é capaz de no fim se traduzir num clube cujos únicos adeptos intervenientes serão só aqueles que o clube não quer ter como adeptos, os não-adeptos, os que continuam a mandar tochas na direcção dos jogadores e assim. Por outro lado, os adeptos sem o clube sentir-se-ão órfãos. Querem ver que depois da orfandade em relação a Amorim, desejam que  sejamos órfãos do nosso próprio Sporting? É que se eu até concordo que o clube não pode ser gerido de fora para dentro, já não estou de acordo que não seja gerido de dentro para dentro e de dentro para fora... [O Amorim já se acabou, o Viana está-se a acabar, Frederico, Frederico, Frederico será que o seu silêncio traz água no bico?]

 

Depois do "levantar a cabeça", só falta ouvirmos que "não deitamos a toalha ao chão". Até a podemos deitar, mas estará lá o grande Paulinho para a apanhar e levantar. Porque por cada leão que cair, outro se levantará. [Não deixa de ser paradigmático de uma certa forma de estar que depois do "Onde vai um, vão todos", que não é mais do que um arremedo de "E pluribus unum", a outra frase mais icónica do mundo Sporting tenha sido proferida por um..  portista.] 

 

Quanto ao jogo, eu gostava de perceber se a ideia de pôr o Quenda a jogar a interior esquerdo, quando o Quenda foi sempre ala direito, obedece a alguma lição de nível III apreendida num livro do Lampedusa ("É preciso mudar alguma coisa para que tudo fique igual"). Mas, também, se há alguma cláusula no contrato do Trincão que o obrigue a jogar 90 minutos, ainda que nesses 90 minutos entregue sucessivamente a bola ao adversário. A não haver, o objectivo deve ter sido treinar a transição defensiva. Ou a paciência dos adeptos, que nesta transição pós-Amorim também já começam os jogos na defensiva. Finalmente, qual a "ambição" desmedida que presidiu a que Harder jogasse 3 minutos? De resto, só quero lamentar que o lesionado crónico St Juste nos intervalos das lesões continue cronicamente a ter paragens cerebrais como no segundo golo dos belgas, em que pôs o marcador do golo em jogo. 

"Na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma" - Lei de Lavoisier. E é isto, Sportinguistas, nós não perdemos, estamos só a transformarmo-nos... Não é, Dr Varandas? 

 

A natureza tem horror ao vazio, logo surgem as ervas daninhas... Oh yeah!!!

 

Tenor "Tudo ao molho...": Gyokeres

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27
Nov24

Tudo ao molho e fé em Gyokeres

Saka, saca rolhas


Pedro Azevedo

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Lembram-se do desespero do Macaulay Culkin em "Sozinho em Casa" ao aperceber-se de que se esqueceram dele? Terá sido a sensação que Maxi Araújo experenciou durante toda a primeira parte ao ver-se sem apoio perante Bukayo Saka. 

A sorte e o azar são factores a não desprezar em qualquer jogo, não sendo o jogo de futebol uma excepção à regra. Ao intervalo, contra o Manchester City, o Sporting poderia ter estado a perder por dois ou três golos de diferença, mas quis a roda da fortuna que tal não acontecesse. Depois, no segundo tempo, os leões justificaram plenamente a vitória. Ontem, novamente, o Sporting não entrou bem no jogo, só que desta vez chegou mesmo ao intervalo a perder por 3 golos. Dir-se-ia assim que teve azar. Todavia, nem só de sorte ou azar se faz um jogo de futebol: quando, num jogo internacional, contra uma equipa de primeiro plano europeu, se admite uma inferioridade numérica num sector nevrálgico como o meio campo, então está-se a dar trunfos a uma eventual má sorte. Foi isso que aconteceu quando João Pereira, na impossibilidade de contar com Pote, escalou Edwards como interior esquerdo, sabendo à partida que o inglês pouco ou nada defende e que por esse flanco o Arsenal geralmente cria mais perigo, não sendo expectável que os médios pudessem ser de grande ajuda, concentrados que presumivelmente estariam em se posicionarem correctamente face ao excesso de adversários no miolo do campo. Ademais, das poucas vezes que Amorim havia começado com Edwards e Trincão em simultâneo, tinha havido a preocupação de dar a Trincão a posição de interior esquerdo, jogando Edwards a partir da direita. Tal talvez pudesse ter esbatido a diferença que o melhor jogador do Arsenal, Saka, produziu no lado direito do ataque do Arsenal, na medida em que Trincão é muito mais competente sem bola, a fechar espaços e a lutar pela posse, do que Edwards. Mas não foi essa a opção de João Pereira, e com relativa facilidade Saka sacou dois lances de inspiração individual que conduziram aos dois primeiros golos, abrindo assim a rolha do futebol champanhe com que os londrinos presentearam o Sporting durante o primeiro tempo. Para piorar o cenário, de um canto, uma bola parada, de um "set pieces" como os ingleses gostam de lhe chamar, viria o terceiro golo, com toda a equipa do Sporting concentrada na marcação na pequena área e Gabriel a surgir de trás sem oposição. 

A ganhar por três, o Arsenal surgiu mais expectante no segundo tempo. E o Sporting aproveitou para igualar a contenda no que respeita à concretização de jogadas de laboratório, quando Inácio desviou ao primeiro poste um canto executado por Trincão. Cresceu o Sporting e atemorizou-se o Arsenal. Por momentos o milagre pareceu possível. Morita e Hjulmand tiveram remates brilhantemente defendidos por esse grande guarda-redes que dá pelo nome de Raya, Gyokeres começou gradualmente a libertar-se do jugo imposto por Gabriel. Mas quem não marca arrisca-se a sofrer e, em novo lance iniciado na direita do ataque do Arsenal, a bola circulou rapidamente para o centro e Inácio e Diomande não foram suficientemente incisivos, cedendo o Sporting um penalty e ficando ainda a agradecer ao árbitro a não expulsão (segundo amarelo) do costa-marfinense. O jogo praticamente terminou aí. João Pereira finalmente lançou Bragança por Edwards e o Sporting pareceu ainda ganhar um suplemento de alma. Durante 15 minutos o jogo instalou-se no meio campo dos "Gunners". Gyokeres rebentou primeiro fisicamente com Gabriel e depois desenhou uma jogada brilhante em que correu maio campo, tirou dois defesas do seu caminho e ainda teve força para enviar um míssil que esbarrou no poste de Raya. Mas faltou a pontinha de sorte que sobejou no jogo contra o City e o Arsenal viria a marcar um outro golo. 

Na sua despedida, Ruben Amorim garantiu a competência de João Pereira mas não deixou de alertar para a importância da estrelinha da sorte que sempre o acompanhou e poderia não transitar para o nóvel treinador. Vis-a-vis o ocorrido com o City e confrontando com ontem, dir-se-ia que Amorim estava cheio de razão. Convém porém não atribuir tudo à sorte e ao azar. A sorte procura-se e encontra-se mais facilmente quando a preparação interliga-se com a oportunidade. João Pereira teve a oportunidade de uma vida e não a quererá desperdiçar. O plantel é bom e está lá para o ajudar. Caberá então ao jovem treinador de futuro tomar melhores opções, escolhas que não facilitem tanto a acção dos adversários como as que infelizmente tomou ontem. A ser assim, as nuvens agoirentas de ontem serão tomadas por um céu limpo e um sol radioso. Os Sportinguistas estão com ele, mas convém que João Pereira não ressuscite o discurso estafado, que aliás se julgava erradicado por Ruben Amorim, de que é preciso "levantar a cabeça" . É que o símbolo do Sporting é um leão rampante, o que significa que fica sempre de pé. Mesmo quando cai...

Tenor "tudo ao molho...": Hjulmand

06
Nov24

Tudo ao molho e fé em Gyokeres

Um argumento caído do Céu


Pedro Azevedo

Antes do jogo era sabido o seguinte: o Manchester City não perdia há 26 jogos para a Liga dos Campeões, um recorde da competição. E ainda não havia sofrido qualquer golo na Champions da presente temporada. Adicionalmente, vencera a exigentíssima Premier League na época passada, chegando assim ao tetra-campeonato, totalizando 6 títulos de campeão inglês nas últimas 7 edições. Perante estes factos, escusado será dizer que o City era super favorito. Mas um jogo de futebol não se joga no computador, nas estatísticas, nas previsões das cassandras apressadas nos jornais e teievisoes. Não, um jogo de futebol joga-se no campo, no relvado. E é presente, e não passado, pelo que tudo o que aconteceu lá atrás não é garantido que se repita. Além de que se trata de um jogo, logo inclui variáveis aleatórias como a sorte e o azar que tantas vezes são desprezadas na sua análise posterior. Serve este último arrazoado para introduzir não de supetão o resultado do jogo. Para quem não viu ou não sabe ainda, recomendo que se acomode, que se sente bem - o resultado foi quatro-a-um para o Sporting!!! 

"Como é que tal foi possível?", perguntará, legitimamente, o Leitor.  Foi possível porque é futebol. E também na medida em que os pontos fortes do Sporting colidiram com os poucos pontos fracos do City e daí resultou a hecatombe inglesa. Pode agora parecer paradoxal, tendo-vos dito primeiramente que o passado não garante o presente, mas a história está cheia de exemplos de superação do mais fraco face ao mais forte. Desde David e Golias, passando por Aljubarrota ou pela Armada outrora julgada Invencível. E ontem fez-se história em Alvalade, na despedida do nosso treinador desse palco sagrado para todos os Sportinguistas. Um enredo que desafiaria o guionista mais out-of-the-box de Hollywood, porque alinhavado no Céu, que Amorim é um daqueles que Deus mais ama e assim transporta com ele uma estrelinha que reluz quando dela mais precisa. Como todo o bom argumento, os sinais iniciais foram contraditórios com o resultado final, como se o Dramaturgo desta história quisesse apanhar o espectador de surpresa. Assim, cedo (3 minutos) o City se apanhou em vantagem no marcador. E para que não houvesse dúvidas de que a noite não seria auspiciosa, pouco depois Gyokeres, o nosso Vik Thor, o Viking e filho de Odin que em boa hora aportou a Alvalade, falhou um golo cantado, mostrando assim uma faceta menos própria de um deus e mais próxima de uma condição humana que se lhe desconhecia. Se o nosso deus está num dia mau, e nós, mortais, nem sabíamos que os deuses poderiam ter dias menos bons, então a nossa glória ou ambição acabará na vala (e não em Vahala) - pensou-se. Mas os guiões mais criativos dão muitas voltas e reviravoltas ("remontadas" é no Bernabéu e este enredo vai mais no caminho de re-béu-béu, pardais ao ninho, conforme adiante se verá) e este centrou-se durante largos minutos num actor secundário que roubou o palco aos designados protagonistas. Falo-vos de Franco Israel, que foi adiando o julgado inevitável, e assim mantendo o Sporting no jogo e dando tempo para que um qualquer milagre se operasse. Eram vagas e vagas constantes de ataque do City, calafrios a seguir a calafrios, mas Israel foi mantendo o sonho da "terra prometida". Até que o menino Quenda agigantou-se e serviu Gyokeres no espaço com maestria. Na profundidade, o Vik Thor ganha artes de Neptuno e nada nem ninguém o pode parar. Resultado: 1-1.

 

O intervalo chegou e com ele a sensação de que o resultado era muito melhor do que a exibição. Mas estávamos dentro do jogo, e assim tudo ainda era possível, o sonho continuava presente e à espera de ser vivido. A verdade é que o jogo reatou-se e o nosso Aladino logo soltou o Pote Mágico, libertando o primeiro de 3 desejos que viriam a ser concretizados na íntegra, deixando Kovacic nas covas e isolando Maxi - não um perna-de-pau qualquer, mas um Super Max(i) - na cara de Ederson. O uruguaio, que no primeiro tempo já havia liderado pelo exemplo, nunca se deixando intimidar e mostrando ganas de ser o primeiro a libertar-se do jugo inglês, não perdoou e pôs o Sporting na frente. Ainda não refeitos da pancada, logo os ingleses viram Trincão a isolar-se na direita. Em pânico, sem perceber o que, o como e o porquê do que estava a acontecer, Gvardiol atropelou-o na área. Subitamente, o City via-se em banho-maria no caldeirão do Panoramix Amorim, mais um exemplo de como um "pequeno" pode fincar o pé a um "grande" ou uma "aldeia gaulesa" se manter invicta face ao todo-poderoso "Império Romano".  Chamado a converter a penalidade, o Gyokeres recorreu à antiguidade clássica do engodo do penalty: guarda-redes para um lado, bola para o outro. De engodo se faz um bom argumento e este ainda estava longe de estar terminado. Eis então, no nosso melhor período, que do inferno do VAR cai um penalty desta vez a favor do City. Para marcá-lo o Haaland, o deus deies, aquele que na antecâmara do jogo suscitara nas TVs e redes sociais um condescendente "pois, o Gyokeres e tal, mas o Haaland é outra loiça...". Se o era, partiu-se, desintegrou-se naquela bola que saiu da marca dos 11 metros para malhar no ferro. Nesse momento, o Sporting ganhou o jogo, até São Tomé deixou de acreditar num qualquer outro cenário que não fosse a vitória leonina. Restava porém perceber por quantos. O City estava reduzido a cacos e nesse transe até um dos seus melhores jogadores no dia (Matheus Nunes) perdeu a compostura e não cedeu à tentação de cometer mais um penalty. Era o descalabro, o desgoverno de uma equipa que não entendia o que acontecia no campo, como se tivesse sido atropelada pelo autocarro que em tempos Amorim dispusera no relvado, antes de lhe ligar a ignição e de inerte ganhar vida. Desta vez o Gyokeres quis que o Ederson adivinhasse o lado e conhecesse os limites da sua própria elasticidade, colocando a bola com a força e pontaria necessárias a que os esforços do brasileiro fossem vãos e inglórios - uma maldade. Estava feito o resultado final de um jogo que foi como uma Marioshka, ou seja, teve vários jogos dentro de si. Como o jogo entre o futuro treinador do United e o actual do City. Ou o duelo particular entre Gyokeres e Haaland, que também terminou com 3 golos de diferença. 

O Homem sonha, a obra acontece. Venha o Braga! Depois, se "o rei está morto", "longa vida ao novo rei". Muito obrigado por tudo, mister Amorim, boa sorte, mister João Pereira!!! Deixem-me sonhar...

 

"Aquele que já não consegue sentir espanto nem surpresa está, por assim dizer, morto; os seus olhos estão apagados." - Albert Einstein

 

Tenor "Tudo ao molho...": Vik Thor Gyokeres. Menções honrosas: Israel, Maxi, Pote (para Martinez ver), Trincão, Quenda e todo o sector defensivo (como entrou bem o Quaresma!)  

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05
Nov24

E se corre bem?


Pedro Azevedo

Um Sporting mais realista do que há 2 anos atrás, definindo a zona de pressão sobre a linha de meio campo e não em cima da área do City, pode fazer um brilharete, hoje, no nosso José Alvalade. 

É essencial não permitir ao City construir desde trás porque tal significaria deixarmos demasiados homens à frente da bola e inúmeros espaços para os ingleses explorarem, um erro notório aliás ocorrido há 2 anos, quando a nossa equipa esticou sem bola o harmónio, oferecendo ao seu adversário um latifúndio entrelinhas para que cavasse a diferença entre as equipas. É preciso evitar a todo o custo, nomeadamente, as penetrações verticais de Kovacic, que quebra linhas com uma facilidade incrível em sprints de 10-20 metros e logo cria desequilíbrios a quem defende. 

Importante e decisivo será também controlar bem as movimentações da ala direita do City, onde Bernardo e Foden alternam para baralhar marcações e ainda há Walker para explorar o comprimento. Aqui talvez tenhamos o problema mais bicudo a resolver. Porque Matheus Reis poderia ser uma solução conservadora na nossa ala esquerda, equilibrando assim mais a equipa, mas devido à lesão de Inácio deverá jogar a central pela esquerda, pelo que Maxi terá aqui uma prova de fogo à sua maturidade táctica. A não ser que Debast jogue como central pela esquerda e entrem St Juste ou Quaresma para a direita, solução que não é da minha preferência pelo seguinte: o holandês muitas vezes deslumbra-se com a facilidade dos seus recursos técnicos e tem paragens cerebrais que lhe afectam a concentração, Quaresma é excelente, traz igualmente velocidade e saída de bola em progressão, mas vem de lesão prolongada e poderá estar sem o ritmo certo. 

Não sei se a opção de Amorim para fazer companhia a Hjulmand no meio campo passará por Morita ou Bragança. Se jogar o português, a ideia será ter mais bola, escondendo-a do City. Mas será isso realista dada a pressão que os ingleses exercerão? Talvez a melhor solução passe por tentar roubar a bola e rapidamente a endereçar a Gyokeres para que ele explore em transição a "profundidade"  e abra espaços para Pote ou Trincão aproveitarem as segundas bolas e uma eventual momentânea desorganização defensiva do City. Creio que essa deverá ser a melhor opção de jogo do Sporting. 

Na esquerda do ataque do City deverá aparecer o nosso velho conhecido Matheus Nunes. Todos conhecemos a sua qualidade de transporte de bola em velocidade e isso exigirá ao nosso ala direito que controle esses movimentos. O problema é que Guardiola irá pedir largura a Matheus, obrigando Geny ou Quenda a deslocarem-se para junto da lateral e assim abrindo muito espaço entre si e o central pela direita. Além de que por vezes Debast será obrigado a dobrar o seu ala, não tendo a velocidade de um Quaresma para o fazer. Aqui penso que um dos médios terá de ajudar a mitigar o espaço que se abrirá, evitando a entrada de jogadores entre o nosso ala e o central pela direita. 

Com bola, o Sporting terá numa primeira fase de ser rápido de processos. Se conseguirmos explorar a "profundidade", depois, numa segunda fase, caso não se gere o caos e não surja uma oportunidade para uma segunda bola, poderemos introduzir a nossa organização ofensiva, o nosso jogo de triângulos que visa isolar jogadores nas oblíquas da área contrária. É possível ferir o City nessa situação. Acresce que Aké e Akanji não são tão fortes na marcação quanto Dias ou Stones, o que poderá dar algum espaço livre na área para Gyokeres ou Pote. Por outro lado, esta dupla de centrais é mais competente na defesa do espaço, mais rápida, pelo que teremos de criar algum engodo de forma a não se concentrarem exclusivamente em Gyokeres e assim mais facilmente o abafarem quando este procurar o comprimento do campo. 


Em resumo, não será fácil ganhar este jogo, mas não é de todo impossível. Necessitaremos de realismo, pragmatismo e conhecimento daquilo que são as nossas melhores qualidades. As lesões e a falta de ritmo de algumas potenciais soluções que mais se adequariam ao que será preciso fazer no sector defensivo não ajudam e poderão ser decisivas a nosso desfavor. De como o Sporting conseguirá camuflar isso, dependerá em grande parte o sucesso ou insucesso da gigante empreitada que terá pela frente. 

 

PS: não mencionei Haaland... Este não pode receber a bola na área. Mesmo de costas, com aquela envergura é letal. E é um perigo na resposta aos cruzamentos laterais e um faról nos apoios frontais que dá, algumas vezes servido directamente pelo pontapé longo de Ederson.

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23
Out24

Tudo ao molho e fé em Gyokeres

Não negar uma ciência que se desconhece


Pedro Azevedo

Com as atenções mais recentes viradas para o Ministério das Infraestruturas - a questão dos autocarros estacionados e assim... - , pouco relevo vinha sendo dado ultimamente às baixas no nosso Ministério da Defesa. Todavia, elas existem, como se comprovou ontem quando o nazareno (Esgaio) realizou o milagre de jogar a central pela direita. E não o fez nada mal, se exceptuarmos aquela ocasião, na primeira parte, em que se viu ultrapassado por um Boving 737 com o número 15 no dorso e a voar baixinho. 

 

Muita gente ignora que os seres vivos presentes num rectângulo de jogo não se circunscrevem a jogadores e árbitros. Há mais, e não estou a falar da bola, por muito que ela às vezes pareça ganhar vontade própria. Refiro-me, obviamente, à relva. Ora, se, aquando da visita a Eindhoven (PSV), a relva quis avidamente engolir os jogadores do Sporting, em Klagenfurt (casa emprestada do Sturm Graz), provavelmente devido a uma qualquer má digestão (de adubos), regurgitou. Em consequência, os tufos que se soltaram da sua superfície foram durante a maior parte do tempo o maior obstáculo às intenções de mister Amorim, porque de resto os austríacos não pressionaram alto, limitaram-se a esperar a chegada do Sporting e assim não constituíram propriamente um grande óbice aos avanços do leão também no marcador:  se no primeiro golo (Nuno Santos, assistido por Geny), o Gyokeres "limitou-se" a servir um daqueles apoios frontais que sempre executa na perfeição a um só toque, no segundo brindou-nos com um número à Ronaldo "Fenómeno" dos tempos de Barcelona, conciliando agilidade e jogo de cintura com força e velocidade, num mix de características que começam num lutador de capoeira, passam por um primeiro centro de rugby e acabam inevitavelmente num grande jogador de futebol. 

 

Os últimos meses têm trazido para cima da mesa o debate sobre como parar Gyokeres. Treinadores no activo ou no desemprego, jornalistas com ou sem carteira, analistas de mais ou menos laboratório, todos vêm expressando o seu douto parecer. E é cómico, porque na verdade pouco ou nada há a fazer: se esperas por ele, a tua inércia é vencida pela sua potência; se tentas antecipar, ele roda o corpo e logo dispara no sentido da tua baliza. Pelo que a única forma de o parar é a tiro de caçadeira, mas isso duvido que possa ser publicamente tolerado, ministrado nos cursos do senhor José Pereira ou advogado em programas televisivos daqueles que fazem a Alcina Lameiras, com o lenço na cabeça e a bola de cristal, parecer uma inocente imberbe na arte da cartomância. Eu estou como a Alcina e não nego à partida uma ciência que não conheço: a robótica sueca que desenvolveu este Exterminador Implacável. 

 

Tenor "Tudo ao molho...": Gyokeres (pelo golaço!!!). Menções honrosas para Israel, Debast, Inácio e Hjulmand

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02
Out24

Tudo ao molho e fé em Gyokeres

Lampadinha na casa da Philips


Pedro Azevedo

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Para avaliar como deve ser o desempenho dos jogadores do Sporting em Eindhoven não basta a abordagem tipicamente jornalística, é necessário recorrer à patinagem artística e suas notas técnica e artística. Então, debrucemo-nos sob esse prisma: em termos de nota técnica, o desempenho foi medonho, com um número imenso de quedas na rotação (Axel e Axel Duplo), uma delas inclusive com um jogador isolado (Quaresma) perante o guarda-redes. Já no que respeita à nota artística, houve quem sobressaísse da mediania e quem tenha ficado aquém. Pela positiva, o Quenda escavou 3 túneis, aproveitando estar nos Países Baixos, país onde o solo não tem relevo, e o Bragança teve um movimento magnífico no lance do golo que daria o empate. Pela negativa, o Debast rodou para o lado errado e depois fez um passe suicida e o Geny nada fez de significativo. Já o caso do Quaresma é particular, na medida em que alternou grandes momentos artísticos com um outro em que praticamente ofereceu um golo ao PSV, o que acabou por lhe prejudicar a nota final. 

O ritmo - aquilo que em futebolês se designa como "intensidade" (ainda que não se meça quantitativamente em Amperes) - a que se joga na Europa contrasta muito com o do nosso futebol doméstico, e o Sporting sentiu-o na pele durante a maior parte do tempo: não só os nossos jogadores chegavam sempre tarde aos lances como a maioria dos ressaltos iam sempre encontrar um neerlandês no caminho. Pelo que só depois da entrada de Bragança a equipa conseguiu ter a bola e estabilizar o seu jogo-padrão. Foi, sem dúvida, o nosso melhor período, mais tarde exacerbado pela entrada do pujante Harder por troca com um errante Trincão. Porque até esse momento, só Quenda destoara de uma mediania a roçar a mediocridade. 

O empate foi o melhor resultado possível face à exibição. Se, perante as expectativas criadas na antecâmara do jogo, podemos dizer que desperdiçámos 2 pontos que nos farão muita falta nas contas finais desta fase, a forma como o jogo decorreu mostra-nos que o pecúlio obtido (1 ponto) largamente superou o nosso desempenho. Foi, por isso, um "bom" resultado. 


No Estádio da Philips, faltou Geny(o) que iluminasse a(s) lâmpada(s). Ainda assim, Amorim, a quem tanto devemos, ontem investido em Professor Pardal com a escolha do ala Geny para interior esquerdo, soube recorrer ao Lampadinha (o pequeno Bragança) e com isso salvaguardar um empate. 

Quatro pontos em duas jornadas devem ter diluído a zero as ínfimas probabilidades de nos apurarmos directamente para os oitavos de final. Mas constituem um razoável número para as contas do play-off, a que se deverão somar vitórias em Graz, Brugge e em casa com o Bolonha, num total provisional de 13 pontos que não nos darão o estatuto de cabeças de série. Depois, sobrarão 3 jogos (com o City, Arsenal e Leipzig) onde qualquer ponto obtido será de ouro tendo em vista a possibilidade de nos situarmos entre o nono e o décimo sexto colocado e assim podermos almejar um melhor sorteio. 

Tenor "Tudo ao molho...": Daniel Bragança

 

18
Set24

Tudo ao molho e fé em Gyokeres

Euclides, Higgs, Thor e o Cisne juntos numa rapsódia verde


Pedro Azevedo

O professor Manuel Sérgio, primeiro, e José Mourinho, mais tarde, defenderam em tempos a ideia de que quem só percebe de futebol, nada sabe de futebol. Pensei ontem nisso enquanto observava as movimentações do trio de ataque do Sporting: a  riqueza do futebol do Sporting deve muito à diversidade da sua linha avançada, que harmoniosamente mistura rectas e curvas, balanceando os ângulos rectos inscritos a alta velocidade por Gyokeres com as hipérboles e parábolas descritas por Pote e as espirais verticais desenhadas por Trincão. Não é só futebol, é também geometria euclidiana pensada e potenciada pelo professor Amorim na Academia de Alcochete e depois aplicada ao futebol. Porque o Rúben não percebe só de futebol, e por isso, ainda que aqui e ali errando como qualquer um de nós mas aprendendo com os erros mais depressa do que a maioria, sabe tanto de futebol. 

Para se entender como chegámos a este "estado de arte" é preciso primeiro perceber que temos um génio entre nós. Porque, se agora há um Gyokeres, que nos facilita bastante o cumprimento de multiplas tarefas, é forçoso não esquecer que tudo começou com Sporar. E, ainda assim, fomos igualmente campeões, conseguindo desse modo gerar os primeiros recursos financeiros que estiveram na origem de um crescimento futebolístico que nos trouxe aqui. Tê-lo feito com Sporar como ponta de lança, um homem tão avesso ao golo que simultaneamente capaz de desafiar o princípio da impenetrabilidade da matéria e de suscitar uma crise de ansiedade num monge tibetano, foi um perfeito milagre. Como milagre é o ser humano, quase 100% de vazio que submetido a um campo magnético liberta uma partícula dita de Deus (Bosão de Higgs) que faz com que o seu corpo se adere como uma tela esponjosa e ganhe uma massa. O nosso corpo sim, o de Sporar ("O Gozão de Higgs") não, daí a bola sempre ter insistido em lhe perpassar o corpo como se do vazio se tratasse e ele fosse somente um holograma. Pelo que para se entender o salto quântico que o nosso futebol deu, basta comparar esse Sporar com o actual Gyokeres... (Agora que tanto se fala virtuosamente sobre os nossos trios, de centrais, avançados ou mesmo Vikings, convém não esquecer que imediatamente antes de Amorim os trios eram tão mal vistos que um deles até passou à história como "Os Três Tristes Trincos".)

 

Ontem recebemos o Lille, o clube mais emblemático da cidade com o mesmo nome que era a capital da antiga região administrativa de Nord-Pas-de-Calais, a mesma que ostentava um leão rampante como símbolo. Havia portanto algum irmandade, ainda que remota, entre Sporting e Lille, e não apenas no que concernava ao idêntico sistema táctico usado por ambas as equipas. 

O Sporting entrou no jogo como um caloiro no primeiro dia de aulas, reservado e assim procurando não dar muito nas vistas. Mas é impossível disfarçar um "elefante numa loja de porcelana", pelo que cedo Gyokeres deu sinais de não estar cómodo com o status-quo. Daí até ao intervalo, Vik Thor Gyokeres não parou de fazer estragos: primeiro assistindo Pote na cara do golo, depois com um passe de chicuelina que tirou 3 adversários do caminho e culminou com um tiro indefensável que inaugurou o marcador, finalmente provocando a expulsão de Angel Gomes, filho do Gil que foi campeão do mundo de juniores por Portugal, em Lisboa. 

Em vantagem no marcador e a jogar em superioridade numérica, o Sporting foi trocando a desconfiança pela crença, paulatinamente regressando ao tipo de jogo que vem caracterizando o início desta época. A pressão a meio campo finalmente tornou-se efectiva e houve então espaço para as arrancadas fenomenais de Gyokeres. Numa delas, a bola sobrou para Bragança, que ao intervalo substituíra o amarelado Morita (um amarelo num amarelado nipónico só por si já seria redundante, pelo que o Amorim assustou-se e evitou vermelho ficar... de raiva). O Daniel então tocou para o lado e o que aconteceu a seguir mereceria uma crónica à parte: Debast, patinho feio na Supertaça, foi o cisne que cantou o fim dos franceses, para tal recorrendo a uma raquetada na bola, qual Passing-Shot, que deixou Chevalier pregado no chão enquanto a bola se anichava no ângulo superior esquerdo da sua baliza. 

Até ao fim do jogo, Quenda e Gyokeres poderiam ter ampliado o marcador, ambas as tentativas goradas por "péquenos" pormenores: o pé trocado do jovem da nossa Formação e o pé milagroso de um francês que milimetricamente desviou o remate do sueco do alvo. Tempo ainda para Israel brilhar, cortesia do seu compatriota Maxi que ainda não teve tempo para ler o guião completo que dita as linhas com que se cose o fio de jogo do leão. 

Sem ser brilhante, o Sporting entrou com o pé direito nesta edição da Champions. Seguem-se 2 jogos fora que é imperioso ganhar, no Phillips Stadium (Eindhoven) e em Graz. Depois, a confirmarem-se essas vitórias, todos seremos José Torres a reclamar que nos deixam sonhar. Sim, sonhar, a forma natural de contornar a velha máxima de Ortega y Gasset, de que "O Homem é o Homem e as suas circunstâncias". 

Tenor "Tudo ao molho...": Vik THOR Gyokeres

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